Um dos grandes nomes da fisioterapia esportiva no Brasil e no mundo, Nilton Petrone, o Filé, é o convidado da semana no Basticast. Na conversa com Lucas Lustoza e João Pedro Ventura, o profissional revelou bastidores de sua relação com Romário.
“O Romário fazia de tudo, era maluco. Ele foi o começo de tudo. Ele, quando tem a fratura no tornozelo, eu era conselheiro do Conselho Regional de Fisioterapia, estava em uma reunião, a secretária me chamou e disse que o Romário estava chamando.
Eu não sabia nem de qual Romário ela estava falando. Eu tenho um primo que gosta de fazer imitações. Eu peguei o telefone enlouquecido já xingando. A voz não vinha, não tinha resposta. Fiz m***. É o Romário mesmo? E ele respondeu que sim. Ele disse que a perspectiva de recuperação era de seis meses e assim ele ficaria fora da Copa do Mundo”, relembrou o fisioterapeuta.
“Eu comecei minha carreira acadêmica como professor em 1986. Naquela época, o curso de Educação Física da Castelo Branco era muito forte. Os jogadores iam fazer o curso, Gotardo, Gonçalves, Zico. Eu chamei a dona da universidade, e falei que tinha uma ideia de fazer um projeto com protocolo de recuperação acelerada para atletas. Ela achou espetacular. O projeto foi para frente, e os jogadores começaram a chegar. Nesse ínterim, eu acabei atendendo um empresário, que amou, e me indicou para o Romário”, comentou Filé.
Primeiro contato com Romário
Ainda na década de 1980, Nilton Petrone teve dificuldades para ganhar a confiança dos jogadores por conta dos métodos diferenciados. Em seu primeiro contato com o profissional, Romário estranhou os equipamentos que seriam usados no tratamento.
“Quando abri minha mala, ele deu risada, porque achava que eu ia mexer com o pé dele, trabalhar mais o movimento. Então mostrei a minha técnica, que era estimular a parte sensorial também. Tinha muita escova, agulha, tubo de ensaio. Expliquei tudo para ele. Comecei a fazer, passadas três semanas, um cara me viu colocar ele em um andador. Fiz, três semanas depois, o Romário estava andando. Na quarta, sem nada. Na quinta, trotando. Na sexta, correndo. Na sétima, não teve jeito, ficaram meus fãs, me veneravam”, comenta o fisioterapeuta.
Confusão na Seleção
Já com a confiança de Romário e outros jogadores da Seleção, Filé teve que conquistar também a diretoria. Mas até conseguir colocar Romário na Copa do Mundo de 1990, o profissional teve que passar por obstáculos internos.
“Convoca ou não convoca. Ele foi chamado na pré-convocação, uma convocação meio melindrosa. Recebi uma carta do PSV, que dizia que o Romário estava recuperado e minha ida para lá era para acompanhamento. Chegamos na Espanha, o Romário falou para eu esperar, o Américo Faria veio e perguntou quem eu era. Ele pediu para eu me afastar uns 20 metros. Romário veio e mandou eu voltar. Enquanto a gente discutia, o Américo voltou com o Paulo Angioni. O Romário disse que eu estava com ele, e se não entrasse, ele também não entraria. Ele perguntou ainda quem era o Américo. Depois disso me mandaram para outro bloco, uns oito de distância de onde estava a Seleção”, disse o fisioterapeuta.
“Entrei, ele não deixou eu ficar lá. Fiquei numa suíte, de lado com a dele. Isso foi pela tarde, tudo aconteceu em um dia só. Quando anoiteceu, depois do jantar, o Romário disse que o Lidio viria e era para nós conversarmos tranquilamente. Eu era jovem, achei que ele ia me receber pelo menos bem, fui apertar a mão dele, ele colocou no bolso. Peguei a carta, e ele disse: ‘não tenho nada contra você, mas o Romário não pode jogar a Copa, por mim ele está cortado. Entreguei a carta do PSV'”, relembrou Filé.
Com o apoio interno de Paulo Angioni, Filé teve até mesmo que entrar em rota de colisão contra os líderes da preparação física para provar que Romário estava apto a disputar o Mundial.
“O Brasil ia jogar, mas não tinha onde me colocar, então me botaram no ônibus. Aí os jogadores começaram a me chamar, o Renato, o Careca. Eles foram para o jogo, quando voltamos, o Nelsinho Batista bateu na minha porta e disse que tinha uma reunião no quarto do Lazaroni. Eu disse que não tinha nada a ver com isso, mas me disseram que eu precisava ir. Todos estavam lá, chefes de delegação, diretor. Quando cheguei, o Lidio disse: ‘já falei com ele, e ele já entendeu que o Romário não tem condições de jogar a Copa do Mundo’. Como eu vou falar numa situação dessa. Eu chamei atenção, e disse que não era verdade. Não tinha lógica eu ir para falar que o jogador não poderia jogar. Então o Lazaroni pediu para ver o pé do Romário e disse que parecia bom e ficou revoltado”, explicou.
“Começou uma saga, contornada praticamente pelo Paulo Angioni. Ele tentou todos os argumentos possíveis para tentar resolver a situação. Um sistema que está em um feudo, com subalternidade imposta. Aquilo ficou preso e não tinha nexo manter mais. Então eu fiquei na Seleção, o Ricardo Teixeira passou um dia e perguntou porque eu não tinha uniforme. Então mandaram um fax para o Brasil para oficializar minha presença como fisioterapeuta da Seleção. Mas não conseguiram, o Paulo me chamou para conversar com o Lidio. Eu me coloquei à disposição, para ajudar, mas ele não quis, disse que tinham outras pessoas que também faziam o que eu fazia. Ali foi “bandalheira”. Eu já atendia 90% dos jogadores da Seleção. Aquilo foi me causando um desconforto, era notícia todo dia. Então disseram que no último treino iriam definir se o Romário iria para a Copa do Mundo. Como ele fez muitos gols, tiveram que convocar”, revelou Filé.
Filé no Basticast!
Com mais de 30 anos dedicados ao esporte, o fisioterapeuta Nilton Petrone é o convidado do Basticast desta semana. Filé, apelido dado por Romário pelos 49kg que pesava na época, coleciona histórias que atravessam gerações do futebol brasileiro e foram contadas para Lucas Lustoza e João Pedro Ventura.
No episódio, Filé relembra bastidores de momentos marcantes, como a briga entre Evaristo de Macedo e Romário no Flamengo, todo o clima que culminou na vitória do Fluminense na Libertadores, os desafios vividos na seleção brasileira, incluindo a briga com Lídio Toledo que não queria levar o Baixinho para a Copa.
